quinta-feira, junho 15, 2006

Pastelaria


Afinal o que importa não é a literatura
nem a crítica de arte nem a câmara escura

Afinal o que importa não é bem o negócio
nem o ter dinheiro ao lado de ter horas de ócio

Afinal o que importa não é ser novo e galante
- ele há tanta maneira de compor uma estante

Afinal o que importa é não ter medo: fechar
os olhos frente ao precipício
e cair verticalmente no vício

Não é verdade rapaz? E amanhã há bola
antes de haver cinema madame blanche e parola

Que afinal o que importa não é haver gente
com fome
porque assim como assim ainda há muita gente
que come

Que afinal o que importa é não ter medo
de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé
de muita gente:
Gerente! Este leite está azedo!

Que afinal o que importa é pôr ao alto a gola do
peludo
à saída da pastelaria, e lá fora – ah, lá fora! – rir
de tudo

No riso admirável de quem sabe e gosta
ter lavados e muitos dentes brancos à mostra

Mário Cesariny de Vasconcelos, Nobilíssima Visão
(1945-1946), in burlescas, teóricas e sentimentais (1972)

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